Benfica pede instrução do processo “e-toupeira” e alega desconhecer factos

A SAD do Benfica requereu a abertura de instrução do processo e-toupeira, segundo documento a que a Lusa teve acesso, alegando que a acusação do Ministério Público (MP) é infundada e que terá de cair nesta fase.

O requerimento de abertura de instrução (RAI) – fase facultativa em que um juiz decide se o processo segue para julgamento – foi entregue hoje no Tribunal da Comarca de Lisboa e assenta em três pontos essenciais, nomeadamente o desconhecimento dos factos imputados ao seu antigo assessor jurídico Paulo Gonçalves e restantes dois arguidos, ambos funcionários judiciais.

A defesa alega “total desconhecimento da Benfica SAD dos factos imputados e inexistência de qualquer intervenção ou atuação ou omissão relevantes da Benfica SAD nas matérias tratadas”.

A acusação do MP considera que o presidente da Benfica SAD, Luís Filipe Vieira, teve conhecimento e autorizou a entrega de benefícios aos dois funcionários judiciais, por parte de Paulo Gonçalves, a troco de informações sobre processos em segredo de justiça, evolvendo o Benfica, mas também clubes rivais.

“Na acusação não se imputa qualquer facto a Paulo Gonçalves ou à Benfica SAD que permita concluir pela posição de liderança daquele no seio da ora arguida [SAD do Benfica]. Não se alega um único facto do qual decorra que Paulo Gonçalves tinha poderes de liderança ou que integrava um qualquer órgão da arguida. Que tinha poderes para, autonomamente, representar a Benfica SAD. Que tinha poderes para determinar a vontade e o interesse da Benfica SAD (poderes de decisão e vinculação). E, muito menos, que podia exercer o controlo da atividade da Benfica SAD”, refuta a SAD encarnada no RAI.

O RAI, de 171 páginas (já com anexos) e assinado pelos advogados João Medeiros, Paulo Saragoça da Matta e Rui Patrício, realça que “em parte alguma da acusação do Ministério Público alega/conclui que Paulo Gonçalves ocupava uma posição de liderança na Benfica SAD”.

A sociedade que gere o futebol profissional encarnado aponta ainda como outros pontos chave “a total ausência de elementos probatórios que liguem a Benfica SAD às atuações descritas na acusação” e a “total omissão de narração de factos concretos na acusação que permitam imputar a prática de qualquer crime à Benfica SAD, havendo ainda contradições na própria acusação“.

A SAD do Benfica está acusada de 30 crimes e Paulo Gonçalves de 79 crimes. O MP acusou a SAD do Benfica de um crime de corrupção ativa, de um crime de oferta ou recebimento indevido de vantagem e de 29 crimes de falsidade informática.

Entre as 17 testemunhas arroladas pelo Benfica constam o presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Fernando Gomes, o presidente da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, Pedro Proença, o ex-presidente do Sporting José Sousa Cintra e também os presidentes dos Sporting de Braga, António Salvador, e do Vitória de Guimarães, Júlio Mendes.

O RAI requer ainda como diligência instrutória o interrogatório da Benfica SAD (na qualidade de arguida no processo), “na pessoa dos seus representantes legais”, os administradores Domingos Soares de Oliveira e Nuno Ricardo Gaioso “para esclarecimento de toda a matéria de facto alegada” no requerimento de abertura de instrução “e complemento dos seus interrogatórios já realizados”.

A Benfica SAD pediu também a realização de uma inspeção judicial ao piso 1 e ao parque de estacionamento do Estádio da Luz.

O processo seguirá agora para o Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, no Campus da Justiça, para ser distribuído a um juiz de instrução criminal, que decidirá que diligências instrutórias requeridas pela SAD do Benfica serão realizadas.

Após isso, o juiz marcará uma data para o início da fase de instrução, o debate instrutório (em princípio serão à porta fechada) e a leitura da decisão instrutória, a qual será à porta aberta.

Segundo a acusação do MP, Paulo Gonçalves, enquanto assessor da administração da Benfica SAD, e no interesse da SAD, solicitou a funcionários judiciais que lhe transmitissem informações sobre inquéritos, a troco de bilhetes, convites e merchandising.

José Silva (oficial de justiça) e Júlio Loureiro (escrivão e observador de árbitros), com a promessa de tratamento privilegiado junto do Benfica, designadamente para assistência a jogos em condições favoráveis, aceitaram proceder como solicitado”, sustenta a acusação.

O despacho de acusação sustenta que tais processos “incidiam sobre investigações na área do futebol ou a pessoas relacionadas com este desporto, designadamente inquéritos em curso e em segredo de justiça, em que era visada, ou denunciante, a Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD, ou os seus elementos”.

Os processos pesquisados pelos dois funcionários judiciais, através da plataforma informática Citius, abrangiam também casos “relativos a clubes adversários e seus administradores ou colaboradores”.

O oficial de justiça José Silva – em prisão domiciliária – e Júlio Loureiro, escrivão e observador de árbitros, estão acusados, cada um, de 76 crimes.

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