O antigo coordenador de segurança da Academia de Alcochete foi esta tarde confrontado com declarações prestadas na fase de inquérito, admitindo que se esqueceu de alguns “detalhes”, após um advogado apontar contradições no depoimento efetuado esta segunda-feira em tribunal.
Ricardo Gonçalves, à data dos factos coordenador de segurança e operações da Academia de Alcochete, foi ouvido na sétima sessão do julgamento da invasão à academia leonina, em 15 de maio de 2018, que decorreu no Tribunal de Monsanto, em Lisboa.
Durante a inquirição, o advogado Miguel Matias pediu ao coletivo de juízes que a testemunha fosse confrontada com os três depoimentos prestados, quer à GNR, quer à procuradora do Ministério Público Cândida Vilar, titular do processo, na fase de inquérito, alegando “contradições e discrepâncias” face ao depoimento prestado na segunda-feira.
O advogado fundamentou o pedido dizendo, nomeadamente, que Ricardo Gonçalves concretizou e individualizou hoje mais agressões e agressores do que aqueles que indicou quando falou na fase de inquérito.
Além disso, a testemunha disse que recebeu um telefonema do arguido Bruno Jacinto, ex-oficial de ligação aos adeptos, e que depois lhe telefonou, mas não indicou, até hoje, este telefonema.
Ricardo Gonçalves explicou que prestou declarações pela primeira vez na esquadra da GNR de Alcochete ainda na madrugada de 16 maio de 2018, após o ataque, “já a uma hora tardia e cansado”, justificação que provocou riso aos advogados dos arguidos. “Ainda hoje, tanto me posso esquecer de uns detalhes e recordar outros“, acrescentou a testemunha.
Miguel Matias questionou a testemunha se desde que prestou declarações à GNR, em maio de 2018, e à procuradora Cândida Vilar, em agosto de 2018, sofreu algum tipo de pressão ou ameaça para que alterasse as suas declarações. “Não, claro que não”, assegurou Ricardo Gonçalves.
O advogado perguntou então a que é que se deveu este esquecimento. “Resulta apenas do facto de ser humano”, respondeu a testemunha. A presidente do coletivo de juízes, Sílvia Pires, afirmou que “não viu contradições”, mas apenas “omissões” e perguntou à testemunha se tem dúvidas do que falou hoje em tribunal. “Não tenho dúvidas do que disse hoje aqui”, afirmou Ricardo Gonçalves.
O advogado Pedro Madureira, alegando “manifestas discrepâncias” nas declarações e explicações de Ricardo Gonçalves, pediu que o tribunal extraísse certidão, para que o Ministério Público investigue.
Contudo, a juíza presidente considerou o requerimento uma “forma de condicionar” o depoimento, explicando que, no final do julgamento, se o tribunal entender que esta ou outra testemunha mentiu, procederá em conformidade.
Para já, sublinhou, “não há indícios de que a testemunha tenha faltado à verdade”.
Durante a manhã, Ricardo Gonçalves relatou ameaças de morte, agressões e injúrias a futebolistas do Sporting — alguns dos quais não mencionou na fase de inquérito —, acrescentando que Acuña e Battaglia foram os principais alvos dos adeptos, mas que o jogador Misic, o preparador físico Mário Monteiro, o treinador Jorge Jesus e que o fisioterapeuta Ludovico Marques, também foram agredidos.
O antigo coordenador de segurança da academia afirmou ainda que o ex-presidente do Sporting Bruno de Carvalho se reuniu com o ‘staff’ um dia antes do ataque, perguntando “se estavam com ele, acontecesse o que acontecesse”.
A testemunha relatou que o antigo presidente do clube, um dos 44 arguidos no processo e que hoje marcou presença no tribunal, reuniu-se em 14 de maio de 2018, no auditório do Estádio de Alvalade, com elementos do ‘staff’ de apoio à equipa principal do Sporting, após o jogo na Madeira, com o Marítimo, que os ‘leões’ perderam por 2-1, falhando a possibilidade de se qualificarem para a Liga dos Campeões.
A testemunha esclareceu durante a inquirição da tarde que entendeu estas palavras no contexto “da saída da equipa técnica”, liderada pelo treinador Jorge Jesus, acrescentando que foi com “essa perceção” que ficou da reunião com o então presidente do clube.
Ricardo Gonçalves relatou ainda uma outra reunião, ocorrida a 7 de abril de 2018, só com o plantel, no mesmo auditório, dois dias após uma derrota com o Atlético de Madrid, e a publicação do antigo presidente do clube a criticar os jogadores na rede social Facebook.
Ricardo Gonçalves disse ter ouvido, da parte de fora da sala, Bruno de Carvalho a chamar o guarda-redes Rui Patrício de “ingrato, armado em diva, vedeta e mimado”.
A testemunha afirmou que ouviu igualmente o jogador William Carvalho a acusar o presidente de ter telefonado a Nuno Mendes ‘Mustafá’, líder da claque Juventude Leonina, para “ameaçar e agredir os jogadores”, ao que o responsável respondeu que “não fez nada disso” e que ia telefonar a ‘Mustafá’.
O advogado Miguel Fonseca pediu ao coletivo de juízes a nulidade desta parte do depoimento de Ricardo Gonçalves, sustentado tratar-se de “conversas privadas” e à porta fechada, entre o seu constituinte e o plantel, nas quais a testemunha não esteve presente.
[sc name=”assina” by=”” url=”” source=”Lusa”]
Deixe um comentário