Bullying na escola, morte do pai, homossexualidade, incapaz de caminhar. Thomas Daley venceu uma prova de saltos para a água, em Tóquio, ao lado do também britânico Matty Lee.
Surpresa nos saltos para a água, nos Jogos Olímpicos de Tóquio: na prova sincronizada de plataforma a 10 metros, a dupla vencedora não foi chinesa, mas sim britânica.
Yuan Cao e Aisen Chen lideravam antes da última ronda mas Thomas Daley e Matty Lee ficaram com a medalha de ouro. A diferença entre britânicos e chineses foi de apenas um ponto e duas décimas. A dupla russa – Aleksandr Bondar e Viktor Minibaev – ficou no terceiro lugar.
Matty Lee estreou-se em Jogos Olímpicos mas Daley, com três títulos mundiais e cinco europeus, tinha ficado com a medalha de bronze nas duas edições anteriores do evento: Londres e Rio de Janeiro. Aos 27 anos sobe ao lugar mais alto do pódio, depois de muitos momentos complicados.
Aos sete anos, o inglês começou a praticar saltos para a água num clube da sua terra natal, Plymouth. Campeão europeu aos 13 anos (o mais jovem de sempre). Aos 14 anos já estava nos Jogos Olímpicos: em Pequim 2008 foi o atleta britânico mais jovem e o mais jovem de qualquer país a chegar a uma final. Aos 15, o campeão mundial mais jovem a representar a Grã-Bretanha. Pelo meio, bullying na escola.
O próprio Daley contou que, poucas semanas depois de ter estado na final dos Jogos Olímpicos de Pequim, há 13 anos, voltou a ser gozado e agredido na sua escola. O Twitter também viria a ser palco de insultos e ameaças.
E a humilhação foi visível no próprio contexto olímpico: ainda em Pequim, em 2008, o seu companheiro de dupla Blake Aldridge disse-lhe que não conseguiu uma medalha na capital chinesa por causa da prestação de Daley.
Vieram os Jogos Olímpicos de 2012, em casa, em Londres. Medalha de bronze, ovação nacional, imensas entrevistas e mais tarde um convite para integrar um programa de televisão. Treinadores começaram a dizer que o jovem atleta estava demasiado distraído e que estava a desperdiçar o seu talento.
No final de 2013, o vídeo que se tornou notícia em quase todo o mundo:
Tom Daley tinha algo para dizer: “Acredito na honestidade. Nunca me senti confortável ao falar sobre relações, até porque nunca tive uma relação séria para ser comentada. Na última primavera conheci uma pessoa, apaixonei-me por ele. É um homem. Fiquei surpreendido mas ele faz-me sentir bem e todo o meu mundo mudou. Não poderia estar mais feliz”.
“Agora as pessoas vão mandar as suas opiniões mas isto nem é nada especial. Continuo a ser o Tom, continuo a querer ganhar uma medalha nos Jogos Olímpicos para a Grã-Bretanha”, disse Daley, na altura com 19 anos.
No mesmo vídeo, Daley lembrou a “montanha russa” que estava a ser a sua vida nos anos anteriores: o seu pai morreu devido a um cancro em 2011, a medalha em Londres 2012 e recordou o bullying na escola.
Thomas Daley chegou ao Rio de Janeiro, em 2016, a pensar que iria conquistar a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos. Ficou novamente com o bronze.
Entretanto, fora do desporto, casou-se com um homem do cinema, Dustin Lance Black (20 anos mais velho), e já tem filhos.
2021 foi o ano do ouro olímpico. Mas 2021 foi também o ano de uma operação ao joelho: no início do mês passado, junho, Daley nem conseguia caminhar. Foi campeão olímpico nesta segunda-feira, apesar de o próprio ter pensado que nunca iria conseguir este título.
“É inacreditável. Sonhei com este momento desde que comecei nesta modalidade, há 20 anos”, disse o campeão, em lágrimas.
“Sou homossexual e campeão olímpico. Sinto-me muito fortalecido por isso. Quando eu era mais jovem, sentia que nunca seria nada, não alcançaria nada, por causa de quem eu era”, acrescentou, em conferência de imprensa.
“I am a gay man and also an Olympic champion. I feel very empowered by that. When I was younger I felt I was never going to be anything, achieve anything, because of who I was.”
We are so proud of you, @TomDaley1994. ~AA pic.twitter.com/J0MYLgh2zb
— Best for Britain (@BestForBritain) July 26, 2021
Curiosamente, a sua treinadora Jane Figueiredo (cujo pai é português) proibiu a dupla britânica de falar em medalha de ouro: “Aprendemos muito no Rio de Janeiro. Muita coisa a acontecer, muitos telefones, muitos jornalistas, muita conversa à volta da medalha de ouro. Desta vez eu disse ao Daley: não quero ouvir essas palavras”.
[sc name=”assina” by=”Nuno Teixeira, ZAP” ]
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