O treinador do FC Porto culpou a ineficácia da sua equipa pelo adeus à Liga dos Campeões. Mas será que tem razão naquilo que diz?
Sérgio Conceição costuma desmerecer a “estatística” nas conferências de imprensa. No entanto, importa referir, em sua defesa, que normalmente o faz levado ao engano pelos jornalistas.
Confrontado com registos e curiosidades históricas, o treinador costuma dizer (e bem) que essas “estatísticas” valem pouco ou nada, no contexto de um jogo que se avizinha.
O “mister” portista tem razão, cometendo apenas o erro de as confundir com a estatística de futebol “a sério”, a que ajuda a identificar padrões e confirmar/desmentir os méritos, fraquezas e oportunidades que se apresentam à vista desarmada.
O que diz então a verdadeira estatística sobre o adeus do FC Porto à Champions, prova na qual o “dragão” costuma brilhar de forma atípica entre emblemas portugueses? Foi o que nos propusemos descobrir, usando como ponto de partida a conclusão retirada pelo comandante “azul-e-branco” na hora do adeus à prova milionária.
“Este jogo foi a imagem do que foram os nossos jogos no grupo. (…) Não fomos eficazes, falhámos golos em momentos importantes.”
Conceição resumiu assim o não apuramento a uma questão de concretização. Terá razão? Vejamos o que nos dizem os analytics da história portista nesta Champions.
A ocasião que dá razão a Conceição
Antes mesmo de nos debruçarmos sobre variáveis mais “nerd” (Expected Goals), começamos por um conceito mais simples, o de Ocasião Flagrante, ou seja, a situação de remate (concretizado, mesmo que nas orelhas da bola) em que o rematador tem pela frente apenas a baliza e o guardião (ou nem esse), sem qualquer outro adversário na linha da bola. Definido o conceito, vamos ao que importa: quantas destas teve o Porto nos pés/cabeça e quantas aproveitou?
O Porto dispôs de nove ocasiões flagrantes (de bola corrida) nos seis jogos da fase de grupos, um registo ligeiramente abaixo do meio da tabela, entre as 23 do fulgurante Bayern e as zero do Malmö. Não foram muitas, é certo mas, tendo em conta o grupo portista, não seria de esperar um volume muito maior. O total é, aliás, o mesmíssimo que soma o Benfica, embora com ainda um jogo por jogar, à hora desta análise.
Ora o problema é que o Porto concretizou apenas duas das nove ocasiões flagrantes que teve ao longo da campanha, um registo que coloca os “dragões” com um aproveitamento de apenas 22% (sete desperdiçadas), batido (pela negativa) apenas pelos 14% do Shakhtar (em sete ocasiões) e pelos 11% do irreconhecível Barcelona (em nove, tantas quantas as do FCP embora com um jogo por disputar).
Os golos estatisticamente esperados… que não apareceram
As ocasiões flagrantes são importantes, mas não quantificam toda a expectativa de golo criada por uma equipa, pois a maioria dos remates à baliza não surgem neste tipo de situações. Para isso temos o cálculo dos golos esperados, Expected Goals (xG), aquele número que encontras nos sumários estatísticos GoalPoint de uma partida. E o que dizem os cálculos de golos esperados (Expected Goals) a favor do Porto, finda esta campanha?
A verdade é que Sérgio Conceição não escolheu o melhor jogo para fundamentar a sua teoria. O Porto andou sempre atrás dos espanhóis neste capítulo, mesmo antes das machadadas finais desferidas pelos “colchoneros” no final do encontro. Mas estará então errada a teoria do timoneiro portista?
A resposta é não, Conceição tem razão. Pese a derradeira derrota seja mau exemplo para explanar o seu balanço, a verdade é que os “dragões” marcaram apenas quatro golos ao longo da campanha, mas criaram/beneficiaram de situações de remate com uma expectativa de concretização de cerca de… oito (8,02) ou seja o dobro.
Este registo coloca os “azuis-e-brancos” com um saldo entre golos marcados e esperados de -4,02, o segundo maior (pela negativa) entre todas as equipas participantes, batido apenas pelos ucranianos do Shakhtar (-4,88) e a par do Barcelona (-4,00).
Quem foram os protagonistas do desperdício? À cabeça surge Mehdi Taremi. O iraniano marcou apenas um golo na campanha, mas beneficiou de situações esperadas para somar cerca de três.
O seu saldo negativo (-1,50) coloca-o como o sétimo mais “devedor” da Champions, num ranking liderado pelo interista Lautaro Martínez (-2,54). O avançado é acompanhado no Porto por Otávio (0 golos, 0,9 esperados), Evanilson (0 golos, 0,7 esperados), Marko Grujić (0 golos, 0,7 esperados) e Vitinha (0 golos, 0,5 esperados). A quebrar a tendência surge o inevitável Luis Díaz. O colombiano é o único “dragão” com um saldo claramente positivo entre o que marcou (dois golos) e o que se lhe exigia (0,9).
Diz-me contra quem falhaste, dir-te-ei porque não te apuraste
Para lá do total simples de golos esperados (xG) na campanha, também a análise da distribuição desses números por encontro dá razão a Conceição, embora também lhe aponte outro pecado relevante na sua equipa. O Porto sofreu 11 golos na prova, mas, usando a mesma métrica, devia ter permitido cerca de… nove (8,54). Feitas as contas o Porto facilitou, ofensiva e defensivamente, num total de seis golos, entre os que devia ter marcado e os que não devia ter sofrido. São golos a mais para um grupo tão complicado.
Eis a distribuição, jogo a jogo, dos golos esperados dos jogos do Porto, identificando também o impacto do aproveitamento na pontuação “azul-e-branca”.
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