Como é que os patinadores fazem múltiplas piruetas e não ficam tontos? A ciência ajuda a explicar

Patinadora Yu-na Kim da Coreia do Sul

A patinagem no gelo é sempre um dos eventos mais aguardados dos Jogos Olímpicos de inverno pelas coreografias impressionantes que os atletas apresentam com elevados níveis de sincronismo e dificuldade, ao ponto de os comuns mortais, sem experiência na modalidade, se questionarem como é que alguns dos passos são possíveis.

De facto, uma das dúvidas que surge com frequência é: como é que os patinadores não ficam tontos ao fazerem tantas rotações e piruetas?

A resposta é simples: na verdade, também eles ficam tontos, apesar de disporem de técnicas para o minimizar. Apesar das quedas, que muitas vezes acontecem nas aterragens dos saltos, os patinadores conseguem girar no ar sem perder o equilíbrio e isso acontece porque os atletas prepararam o seu corpo para anular os efeitos, descrevem os especialistas.

Mirai Nagasu conquistou uma medalha de bronze nos Jogos de Inverno na Coreia do Sul e descreve que ao longo da sua carreira sempre sentiu as rotações, mas aprendeu a recentrar o foco. “Acho que temos uma capacidade aprendida contra o impulso que nos atinge enquanto giramos”, aponta.

Para além da explicação de quem sentiu os efeitos no terreno, também os cientistas, que estudam o fenómeno à distância, têm as suas justificações. É o caso de Kathleen Cullen, professora de engenharia biomédica na Universidade Johns Hopkins.

A investigadora estudou o sistema vestibular, responsável pelo sentido humano de equilíbrio e movimento, o que lhe permite sugerir que proceder às rotações sem se ficar tonto é uma arte que se aperfeiçoa com o tempo.

No início das suas carreiras, skaters, patinadores, ginastas e outros atletas sentem-se tontos quando giram, mas acabam por treinar os seus cérebros para melhor interpretar essa sensação.

“Há uma coisa profundamente fundamental que acontece nestes indivíduos que fazem muitíssimos treinos e isso é uma mudança na forma como os cérebros processam a informação”, descreve a investigadora.

“Quando nos movemos em sentido rotativo, estamos a ativar os nossos canais semicirculares, os nossos sensores rotativos. Eles estão cheios de um fluído e conseguem sentir cada movimento que fazemos. Mas quando se pára, o fluído tem inércia e tende a continuar a mover-se. Na realidade, têm uma falsa sensação de movimento.

Ao fim de anos de treino, os cérebros dos patinadores artísticos adaptam-se e aprendem a ignorar este erro, descreve a especialista. “Isto é conseguido ao longo do tempo e com cada sessão de treino, dia a dia, à medida que o cérebro compara as suas expectativas com o que está a receber a partir dos seus recetores sensoriais. “

Resumindo, Kathleen Cullen aponta que a maioria das pessoas sentem que o mundo continua a girar, mesmo depois de terem parado com o movimento de rotação. Mas no caso nos atletas, sobretudo de nível olímpico, geralmente isto não acontece, já que os seus cérebros mudaram para suprimir a sensação. Eles também aprendem a reduzir o quão tontos se sentem, por exemplo, focando-se num ponto de referência ou num objeto estático, o que ajuda a minimizar a perda de equilíbrio, por exemplo.

As bailarinas também têm por hábito girar a cabeça durante cada rotação para fixar uma referência visual. Da mesma forma, no final do movimento, elas voltam a fixar os seus olhos num ponto específico da parede para conseguir uma referência fixa.

Segundo Brigid Dwyer, professor de neurologia da Escola de Medicina da Universidade de Boston, o cérebro e a parte interior da orelha estão em constante comunicação com o corpo, de forma a alcançar o equilíbrio.

“Para a maioria das pessoas, contudo, as vertigens são um potencial problema durante as atividades mais rápidas e mais enérgicas”, diz Dwyer.

“Surpreendentemente, quando necessário, os nossos cérebros podem ser ensinados ao longo do tempo a lidar melhor com as tarefas vertiginosas que encontramos”.

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