“Anda lá, ó preto!”. Incidente racista contra Sandro Cruz, do Benfica B, é repudiado pelo mundo do futebol

O jogador já recebeu a solidariedade de Nélson Veríssimo e do Rio Ave. O Sindicato de Jogadores de Futebol pede mais medidas de combate à discriminação nos recintos desportivos.

O futebolista português Sandro Cruz, do Benfica B, denunciou ontem um “episódio nojento”, por ter sido alvo de insultos racistas quando foi substituído na derrota em casa do Rio Ave (2-1), na II Liga.

“Hoje, infelizmente, passou-se mais um episódio nojento na nossa sociedade e no nosso desporto, por isso é que continua como está. Mas, continuamos a ser hipócritas o suficiente para dizer que não somos um país racista”, escreveu o jogador de 20 anos nas redes sociais.

Cruz saiu em cima da hora de jogo na visita aos vilacondenses, que ascenderam à liderança do segundo escalão, e há gritos audíveis na transmissão televisiva do encontro.

“Pior é saber que uma massa associativa apoia um clube que está cheio de profissionais ‘pretos’, mas ousam chamar-me ‘preto’”, denunciou.

À Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP), exige “medidas severas para com este incidente”, e que o Rio Ave “jogue à porta fechada durante muito tempo”.

“Que este episódio seja para refletir e saber que somos muito melhores que isto. E que as campanhas de ‘Racismo Não’ [da LPFP] acabem. Porque é só para fechar os olhos, porque continuam tantos racistas por Portugal fora”, acrescentou.

Sandro Cruz é internacional sub-17 e sub-16 por Portugal, tendo começado no Sporting de Braga antes de chegar ao Benfica em 2014, para os sub-15. Tem 35 jogos pela equipa B dos ‘encarnados’.

O Rio Ave respondeu ao incidente afirmando sentir “solidariedade” com o jogador. O emblema nortenho, através de um comunicado, vincou que “não se revê em qualquer atitude de teor racista ou desrespeitosa para com qualquer pessoa”, garantindo que no Rio Ave se “repudia qualquer ato de racismo, xenofobia ou outro que vise ofender ou ostracizar alguém”.

“Os temas raça, religião, opção ideológica, política ou orientação não são sequer assunto. Sempre tivemos e temos atletas de várias nações, crenças e etnias que foram e são ídolos dos nossos adeptos e acarinhados por todos”, pode ler-se num texto publicado pelo clube nortenho.

Os responsáveis do Rio Ave dizem que “não se aperceberem, no decorrer do encontro [da 30.ª jornada], de qualquer ato de racismo para com o atleta Sandro Cruz”, mas prontificaram-se a ajudar a identificar os causadores do incidente.

“Demonstramos toda a nossa solidariedade para com o atleta do Benfica [Sandro Cruz], prontificando-nos a colaborar com as autoridades na identificação dos presumíveis perpetradores de atos indignos, de forma a serem culpabilizados por tal”, garante o clube de Vila do Conde.

O Rio Ave termina a nota pedindo que “não se confunda a árvore com a floresta”, lembrando que “um ato isolado não deve ser atribuído à instituição Rio Ave nem à generalidade dos seus adeptos, que partilham dos mesmos princípios e valores”.

“É degradante e lamentável”

O treinador da equipa principal do Benfica, Nélson Veríssimo também comentou o caso na conferência de imprensa após o derby com o Sporting, manifestando o seu apoio para com o jogador.

“Quero dar um abraço ao Sandro, nosso jogador de equipa B, que foi vítima de comentários racistas. É degradante e lamentável. Eu sei que ainda existe. Mando um abraço ao Sandro e a todos os jogadores que são vitimas de racismo por esse país fora. Sei que foi algo que lhe tocou muito“, declarou.

O jogador reagiu às palavras do técnico no Twitter, agradecendo a sua solidariedade do “fundo do coração”.

O Sindicato dos Jogadores de Futebol também emitiu um comunicado onde condena o caso e apelou à imposição de mais medidas para a promoção de uma “melhor cultura desportiva em Portugal”.

O organismo considera ainda que o incidente “reflete um comportamento totalmente inaceitável e que mancha a imagem do futebol português”. “É, aliás, uma ocorrência que se soma a muitas outras nesta época desportiva, em diferentes escalões e competições, que demonstra a dimensão do problema e a necessidade de uma abordagem transversal”, afirma.

Na presente época, também houve denúncias de casos de racismo contra Lincoln no jogo entre o Santa Clara e o Braga. Gustavo Assunção também foi insultado no confronto entre o Tondela e o Famalicão.

Em Fevereiro de 2020, num jogo frente ao Vitória de Guimarães, Moussa Marega, que na altura defendia as cores do Futebol Clube do Porto, abandonou o relvado após ser alvo de insultos racistas — um caso que suscitou um debate nacional sobre o problema e que recebeu cobertura mediática internacional.

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