O 25 de Abril fez-se, mas deixou o desporto (e a saúde) para trás

Portugal nos últimos Jogos Olímpicos – Tóquio 2020

Apesar de a revolução do 25 de Abril de 1974 ter democratizado o desporto, em Portugal, o Estado deixou-o sempre para 2.º plano. Hoje, somos um dos países com os índices de atividade física e prática desportiva mais baixos da Europa.

A revolução do 25 de Abril de 1974 trouxe uma democratização ao desporto.

No entanto, o setor nunca foi prioridade – com repercussões na saúde dos portugueses.

“O 25 de Abril abriu o país ao mundo, e o desporto beneficiou também dessa circunstância, da democratização da sociedade portuguesa. Foi transversal, com ritmos de desenvolvimento distintos, mas com consequências positivas no sistema desportivo nacional”, disse José Manuel Constantino, presidente do Comité Olímpico de Portugal (COP) em entrevista à Lusa.

No entanto, o presidente do COP lamenta que, por questões histórico-culturais, o desporto nunca tenha sido prioridade política.

Apesar do óbvio “avanço muito significativo” que Constantino vê como fruto da revolução, “os processos de desenvolvimento não são unívocos, nem apenas com avanços”, e o que se seguiu acabou por deixar Portugal “aquém” do que podia ter sido feito.

“A circunstância de Portugal ter vivido sempre sob o risco de equilíbrio das finanças públicas, e tido intervenção externa para equilibrar essas contas, condicionou muito as políticas públicas, e as políticas públicas para o desporto. Por questões histórico-culturais, nunca foi considerado de primeira linha nas preocupações. Já nem digo prioridade”, lamenta.

Se “nem todos os problemas se resolveram”, por outro lado “um conjunto de políticas na área do desporto ficaram aquém do que as circunstâncias permitiriam, pelo foco que foi dado a outras matérias”.

Faltam sempre condições

Na opinião de José Manuel Constantino, Portugal não teve condições nem para centralizar os desporto – por falta de planeamento – nem tem liberalizá-lo – por falta de dinheiro.

“Há uma questão de natureza mais conceptual, ideológica, que tem a ver com o modelo. Os países do sul da Europa foram muito marcados pelo modelo que teve origem na antiga União Soviética, de planeamento centralizado“, considerou.

“Passámos, na minha leitura, de uma situação em que os primeiros anos são muito marcados por esse modelo, para uma outra, a que vivemos nos últimos 20 anos, de ultraliberalismo na situação desportiva”, refletiu.

Sem “economia para modelo centralizado nem condições para modelo liberal”, com o desenvolvimento nacional “atrasado em relação à generalidade dos países europeus”, Portugal fica à mercê de uma política ‘desnivelada’.

O corpo é que paga

A juntar a isso, Portugal tem hoje alguns dos índices de atividade física mais baixos e prática desportiva da Europa – comprovados no último Eurobarómetro quanto à matéria.

“Soluções que tiveram sucesso noutros contextos não são soluções para Portugal. É preciso um equilíbrio entre o papel do Estado, como regulador, incentivador e estimulador, e o das organizações desportivas, do ponto de vista de construção das dinâmicas, quer no acesso à prática, quer na especialização, designadamente no alto rendimento”, aponta o presidente do COP.

José Manuel Constantino considera também que Portugal “investiu pouco do ponto de vista da construção da doutrina, reflexão de caminhos e debate das suas singularidades”.

Democratização é inegável

Apesar do supramencionado, a democratização e o muito que foi conseguido permite a José Manuel Constantino fazer um balanço geral “muito positivo”.

Entre as melhorias imediatas, o dirigente elencou a “abertura da prática desportiva” a toda a população, o respeito pelo livre associativismo, o aumento de competitividade em competições internacionais, bem como “a melhoria da qualificação dos quadros técnicos que envolvem o movimento desportivo”.

“Subjacente a este movimento, esta ideia, que é uma ideia que se mantém, de que o desporto é para todos, independentemente da idade ou competências técnicas. É para todos, e é isso que, de algum modo, justifica a sua salvaguarda na Constituição”, acrescenta.

O preseidente do COP reforçou ainda o papel da abertura e qualificação do desporto nacional – um ponto relevante também para Avelino Azevedo, presidente do Conselho Nacional de Associações de Profissionais de Educação Física e Desporto (CNAPEF), de resto recém-eleito presidente da Associação Europeia de Educação Física.

Azevedo lembra que o setor do desporto, e em particular a educação física, acompanhou a sociedade na abertura democrática, acabando com as aulas separadas por género e permitindo equiparar os salários, e estatuto, dos professores de educação física a qualquer outro docente.

[sc name=”assina” by=”ZAP” url=”” source=”Lusa” ]


Comentários

Um comentário a “O 25 de Abril fez-se, mas deixou o desporto (e a saúde) para trás”

  1. O 25 de Abril não “fez-se”.
    O 25 de Abril é uma obra em permanente construção, dinâmica e inacabada, para grande desgosto dos que aspiram por alívio.
    Tudo o que “ficou para trás”, há-de um dia ser realidade, e podem ter a certeza que irá muito além do que imaginam.
    Desporto e Saúde, antes e depois de Abril?
    A preguiça (e a má fé) não vos fica bem. Ora façam lá um esforçozinho, uma ligeira comparação…
    Vão ver que não doi nada, e só têm a ganhar… conhecimentos, no mínimo.

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