A ciência sugere que os atletas de elite são geralmente mais inteligentes do que nós. Afinal, o segredo do Ronaldo pode não ser apenas o “trabalho árduo”.
O ano era 1920. George “Babe” Ruth cumpria a primeira época a jogar basebol pelos New York Yankees.
Durante essa ano, “The Bambino”, como era apelidado, marcou uns incríveis 54 home runs. Só ele marcou mais home runs do que qualquer outra equipa.
No entanto, Ruth estava longe de ser um exemplo de proeza atlética. Ou seja, o contrário do que aquilo o que representa hoje Cristiano Ronaldo.
O basebolista era “gordinho”, não gostava de treinar e era constantemente visto em festas a beber e a jogar.
Então, como é que ele conseguiu ser tão grande no campo de basebol?
Para responder a esta pergunta, um proeminente jornalista desportivo do New York Times, Hugh Fullerton, bateu à porta do laboratório de psicologia da Universidade de Columbia, onde dois investigadores graduados, Albert Johanson e Joseph Holmes, foram chamados a responder.
A questão de Fullerton era simples: se os feitos de Ruth não podiam ser explicados pelas capacidades físicas, então que outros fatores poderiam estar envolvidos?
Não foi surpresa para ninguém quando os investigadores descobriram que, nos testes psicológicos, Ruth tinha resultados mais elevados do que a média da população em todos os testes que efetuou.
Os resultados dos testes de Ruth serviram de base a um artigo de Fullerton na Popular Science Monthly intitulado: “Por que é que “Babe” Ruth é o melhor batedor de home run?”
Since the #ArchivesHashtagParty theme is #ArchivesSports, we’re asking one of the biggest questions in sports history: Why is Babe Ruth among the greatest #baseball players of all time? ⚾
Thankfully, psychologists “solved” this mystery for Popular Science Monthly back in 1921… pic.twitter.com/9qUXzpV7Qu— Cummings Center for the History of Psychology (@CCHPsych) September 2, 2022
Estas primeiras investigações mudaram a perspetiva popular sobre o desempenho desportivo, sugerindo que os atributos físicos não eram a única razão pela qual os atletas eram capazes de se destacar – as capacidades mentais estavam finalmente no centro das atenções.
A evolução da psicologia do desporto
Ruth superou as pessoas normais em termos de atenção, memória e tarefas cognitivas.
Foi preciso quase um século para que os cientistas do desporto descobrissem se essas capacidades de alto nível eram uma caraterística comum aos atletas de elite ou se Ruth era apenas um caso isolado de genialidade.
Num estudo publicado em 2017, na Springer Link, centrada apenas em atletas, os descobriu-se que os atletas dispunham de áreas cerebrais mais desenvolvidas, quando envolvidas na atenção, memória e controlo motor quando tomavam decisões relacionadas com o desporto.
Depois, em 2022, uma revisão de Nicole Logan e colegas da Northeastern University, nos Estados Unidos, reuniu 41 estudos que comparavam atletas profissionais e controlos normais, com não atletas.
Os dados de 5.339 participantes (incluindo 2.267 atletas) foram meta-analisados. Os resultados mostraram pontuações significativamente mais elevadas na atenção e na tomada de decisões entre os atletas profissionais em comparação com as pessoas normais.
Os atletas geralmente superam-nos em tarefas cognitivas – mas porquê?
Foi o aparecimento da neurociência cognitiva que permitiu aos cientistas mapear as redes neuronais envolvidas na imagética desportiva (como a capacidade dos atletas de reproduzir na sua mente situações relacionadas com o desporto) e na tomada de decisões dos atletas em situações de jogo.
Três segredos para o sucesso
Atenção, memória e criatividade – com nomes técnicos controlo inibitório, memória de trabalho e flexibilidade cognitiva, respetivamente – são as três funções executivas fundamentais utilizadas pelo cérebro para executar tarefas complexas.
Sobre isso, foi publicado mais recentemente (2012) um estudo mais inovador sobre o papel das funções executivas no desempenho desportivo.
A equipa do Instituto Karolinska, na Suécia, comparou as três funções executivas fundamentais de jogadores de futebol de elite da primeira divisão com os seus homólogos da quarta divisão (normalmente apenas atletas semi-profissionais).
Os jogadores da primeira divisão tiveram um desempenho superior ao dos jogadores da divisão inferior em todas as tarefas de funções executivas.
Resultados semelhantes foram encontrados noutros estudos ao longo da última década, um dos quais em 2023, que comparou jogadoras de futebol e futsal com as suas congéneres amadoras.
Descobriu-se que os atletas de elite superam as pessoas normais na tomada de decisões e no funcionamento executivo.
E o maior deles todos: a prática
Além de se distinguirem na atenção, memória e criatividade, os atletas de elite são decisores altamente especializados porque o praticam todos os dias.
Superam as pessoas normais em termos de flexibilidade cognitiva e inibição, o que pode levar a decisões mais inteligentes dentro e fora do campo.
Ser criativo e encontrar melhores soluções para vencer um adversário é o que o desporto representa, ao passo que muitas pessoas normais como nós têm dificuldade em enfrentar grandes quantidades de informação ao mesmo tempo.
A prática e um pouco de predisposição biológica tornam a maioria dos atletas de elite mais inteligentes do que nós.
Portanto, não foi só trabalho. Provavelmente, o Cristiano Ronaldo chegou onde chegou, porque é mais inteligente do que nós.
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