O sucesso olímpico do Japão seguiu-se de um falhanço na luta contra a pandemia

Embora os Jogos Olímpicos tenham sido um enorme sucesso para os japoneses, no que toca à pandemia de covid-19, foi um grande fracasso para o país.

Do ponto de vista desportivo, os Jogos Olímpicos de Tóquio foram um grande sucesso para o Japão. Terminando em terceiro atrás dos gigantes olímpicos dos Estados Unidos e da China, o Japão garantiu o recorde de 27 medalhas de ouro.

No entanto, à medida que a cerimónia de encerramento atingia um crescendo, nas ruas de Tóquio, ambulâncias levavam pacientes de hospital em hospital numa busca desesperada por camas disponíveis.

Durante a primeira semana de agosto, houve 2.897 casos de ambulâncias incapazes de admitir pacientes em hospitais de todo o país, um aumento acentuado em relação às semanas anteriores. E com a variante Delta agora dominante, a cada dia está a verificar-se um número recorde de novos casos de covid-19.

Pouco antes dos Jogos Olímpicos, tudo parecia estar no caminho certo: o programa de vacinação do Japão tinha acabado de atingir a impressionante marca de um milhão de vacinações por dia, o número de casos era gerível e tanto o Comité Olímpico Internacional como o Governo japonês tinham prometido uns Jogos “seguros e protegidos”. Desde então, porém, a situação do Japão entortou.

Atuar em ‘modo desastre’

Agora, o Japão enfrenta não apenas casos recordes, mas também números recordes de pacientes internados com gravidade: 1.974 em 26 de agosto de 2021. Só em Tóquio, as infeções diárias ultrapassaram 4.000 em agosto, incluindo mais de 270 casos graves até ao momento.

Novas diretrizes a estipular que apenas pacientes de alto risco sejam hospitalizados significa que mais de 20.000 indivíduos infetados em Tóquio ficarão em casa. Sem surpresa, estão a surgir relatórios de pacientes cujas condições deterioraram rapidamente, em alguns casos terminando em morte.

Infographic: Japan's Virus Surge Continues During Olympics | Statista Para lidar com este aumento de pacientes incapazes de receber cuidados médicos, o primeiro-ministro, Yoshihide Suga, delineou planos para estabelecer “estações de oxigénio” para fornecer oxigénio suplementar fora do hospital e para oferecer o tratamento com Ronapreve para os pacientes usarem em casa.

O painel de especialistas do governo descreveu a situação como “fora de controlo”, com os hospitais da capital a operarem agora em “modo desastre”. O painel está a alertar que, nesta fase, o público deve tomar as suas próprias medidas para se proteger do vírus. A atenção do público fixou-se na área metropolitana de Tóquio, mas o vírus agora espalhou-se e está a galopar por todo o país.

O papel dos Jogos Olímpicos

Houve ampla oposição à realização dos Jogos Olímpicos antes do seu início, já que o público era cético em relação às alegações de Jogos “livres de risco”. Sem dúvida, o evento ajudou a espalhar o vírus.

Afinal, não eram os atletas que eram o problema, mas sim a mensagem confusa de organizar o maior megaevento do mundo no meio de uma pandemia. Apesar de os espectadores não serem permitidos nas instalações olímpicas, as pessoas ainda se reuniam para assistir aos jogos em parques e bares por todo o país. A conformidade do público com as medidas governamentais deteriorou-se.

Como explicou o próprio chefe especialista em covid-19 do Governo de Suga, Shigeru Omi, os Jogos Olímpicos “afetaram a perceção do público” da crise, enfraquecendo a mensagem de permanência em casa do próprio Governo e debilitando a declaração do estado de emergência.

A vaga atual do Japão começou a diminuir, mas ainda não atingiu o seu pico. O seu impacto no sistema de saúde já é visível e provavelmente vai agravar-se. As consequências vão revelar-se com o tempo.

Um problema fundamental é que o Governo perdeu credibilidade. Organizar os Jogos Olímpicos foi apenas a última de uma série de mensagens contraditórias sobre a covid-19 — no ano passado, a campanha de viagens “Go To” do governo incentivou o turismo em plena terceira vaga do país, enquanto a campanha de vacinação atrasada é em parte resultado da priorização do desenvolvimento de vacinas domésticas em relação às importações.

O recente encobrimento do primeiro caso japonês da variante Lambda, por estar relacionado com os Jogos Olímpicos, aumentou a desconfiança do público.

De momento, é difícil ver o Governo reconquistar a confiança do povo e as perspetivas de curto prazo são desanimadoras. No entanto, conforme a situação se deteriora, o próprio público japonês pode alterar o comportamento o suficiente para retardar a propagação do vírus.

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